Tempo turvo, nuvens formavam-se no céu. Ouvia-se pequenas trovejadas. E apesar dos anúncios de que faltava pouco tempo para haver queda de água, as crianças saindo duma portinhola na parede, abaixados em silêncio, seguiam-se para o campo.
Logo Marcelo, um garotão de cor preta e cabelos que cresciam para cima como de ovelha se encontrava na frente de seus dois amigos; de repente parou sobre uma pequena pedra e seu amigo pisou em outra do mesmo tamanho, que adentrou no chão. Olharam para uma enorme pedra que começou a se mover e mostrar um compartimento com um pequeno sofá formado por pedras e almofadas. Em suas paredes rochosas havia esculpido prateleiras com tubos de vidro onde corria um líquido fluorescente que iluminava todo o ambiente. Marcelo esperou todos entrarem e vendo que os pingos da chuva começaram a cair, ele pisou sobre outra pedra que se sobressaía do piso rochoso e indicou para seu colega pouco menor fazer o mesmo sobre outra pedra para fechar o compartimento e mantê-los livres da chuva. O menino maior, após ver a pedra se mover novamente para fechar, resolveu pegar da prateleira rochosa um pequeno objeto de vidro, no formato duma flauta com um buraco no meio e um botão numa ponta. Ele mirou o buraco em direção a sua boca e pressionou o botão, logo esguichou um creme branco; após ele saborear, disse:
- Ummm! Bom!
- O que é isso? – Perguntou seu colega, de cor branca e cabelos encaracolados como algodão ao abrir a flor, quem para Marcelo ver seu rosto tinha que abaixar os olhos, conhecido como Tadeu.
- Ah! Isso é uma coisa que meu pai me deu, ele mesmo a inventou. Todo esse local cavernoso é como o centro duma máquina que tem vários tubos. Esses tubos estão dentro do chão, perto de raízes de árvores, eles passam por pequenos buracos nas pedras e vem parar dentro desta caverna; após você tirar esse pequeno tubo e consumir esse líquido que a máquina faz, você coloca de volta encaixando no local certo e a máquina limpa e faz mais deste creme. Assim podemos saborear o quanto quiser. Para ter tudo isso é só não quebrar nada e o que tirar, colocar de volta no lugar. Assim a máquina nos proporciona esse creme cheio de vitamina e muito gostoso. Quer provar? Ainda pronunciando a pergunta, ele inclinou o objeto e pressionou o botão, esguichando o creme para cima, logo este foi aparado pela sua boca. Ele pressionou o botão novamente e o creme, após subir, desceu direto na boca de seu colega, quem após saborear disse:
- Ummm! Não é tão gostoso quanto aparentou na sua expressão, mas também não é ruim.
- Como assim, não é ruim? Isso aqui é a coisa mais... – Enquanto os dois discutiam o objeto da mão de Marcelo foi agarrado e retirado pelo seu colega, ainda menor que Tadeu; cor parda, cabelos escuros e lisos como se estivessem sido lambidos por uma vaca, de nome Ricardo.
O pequeninho se empanturrou com o creme durante várias vezes que, em momentos oportunos, saíram do colégio interno, andando na direção da caverna secreta. O pequeno Ricardo esquecia o tempo enquanto estava saboreando o creme. Seus dias completaram uma semana e logo, além de melhorar seu apetite por legumes, verduras e frutas, ele sentiu vontade de ler. Os livros passaram em sua frente como se fosse combustível para uma máquina em chamas. Quase completando um mês indo todos os dias ao local secreto, ele começou a refletir sobre questões que surgiam em seu pensamento, como: “quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha?”, então ele resolveu começar a escrever suas conclusões. Ao passar o tempo seu corpo se avolumou e em frente a seus colegas passava um vultoso garoto.
Seis meses depois. Dentro do corredor da entidade um homem de estatura baixa, cabelos escuros e lisos, como cabelos de bezerro que foi lambido pela mãe, andava com passos rápidos para acompanhar a diretora que tinha estatura alta e o conduzia pelo corredor. Enquanto o homem se distraiu conversando com a diretora, esta subitamente barrou uma professora que acabara de sair duma sala com sua mão grudada na de Ricardo e disse:
- Com licença, professora... –E dirigindo seu olhar ao homem, continuou - Senhor, aqui está ele!
O homenzinho passou seu olhar na figura da criança e fitou a diretora. Com expressão séria, ele seguiu na direção da sala de aula que a professora tinha saído; entrando na mesma, examinou a aparência de cada aluno, até que viu certa cadeira com uma criancinha trajando uma camisa como a que Ricardo estava vestido no dia que ele partiu sob tempo turvo, embaixo de forte chuva, com trovejadas e relampagueadas. Vagarosamente ele se aproximou da pequena criança, colocou sua mão direita sobre o ombro direito do garoto, observou o rosto dele virando-se de encontro ao seu. Mas, quando ele virou seu rosto em 90 graus, que é meio círculo, a metade do caminho para virar a face para trás, o homem percebeu seu erro e abaixou a cabeça.
De repente, Ricardo que já tinha percebido que seu pai não o reconhecera, tocou-o em sua mão e exclamou:
- Pai! – Imediatamente o homem de estatura baixa, reconheceu aquela voz e ergueu sua cabeça novamente. Avistando o garotão que estava sendo conduzido pela professora, reconheceu em seus olhos, seu rosto e seu sorriso, os traços do filho. E, transbordando de alegria, um forte e demorado abraço os envolveu. E durante aquele instante eles não tinham outra forma para expressar tanto sentimento quanto aquele gesto e o filho sabia que o pai o amava independente de sua aparência ter mudado.
Fim
Autor: Kmin Atétu
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